quarta-feira, 6 de outubro de 2004

Princípio do utilizador-pagador, portagens, taxas e impostos

O governo já definiu na sua agenda política, como objectivo claro, o fim das auto-estradas sem custos para os utilizadores, defendendo antes o Princípio do utilizador-pagador, por achar que é socialmente mais justo e financeiramente mais equilibrado.
Passemos, por ora, um pouco à frente da discussão acerca do mérito de tal postura para lançar uma interrogação: aplicado que seja o Princípio do utilizador-pagador, em todas as auto-estradas, poderão tais utilizadores serem, finalmente, tratados como tal?
Vejamos, existem 3 grandes grupos de receitas públicas:
1 - As receitas patrimoniais: que se reportam a receitas voluntárias, resultantes de obrigações voluntariamente assumidas pelos cidadãos, como é o caso o produto da alienação de património do Estado.
2 – As receitas creditícias: reportam-se a empréstimos contraídos pelo Estado para vários fins, tais como para cobrir défices orçamentais ou de tesouraria.
3 – As receitas tributárias: que são de carácter coactivo, resultantes de imposição legal, que resultam da ideia que o benefício da actividade financeira do Estado é para todos, logo todos terão de contribuir para a cobertura das despesas que origina. Dentro destas receitas, temos:
I) Os impostos: prestações coactivas unilaterais, impostas a quem preenche certos requisitos legais, para a realização de fins públicos, sem qualquer carácter sancionatório.
II) As taxas: são também prestações coactivas unilaterais mas que só são exigidas a quem aproveita uma dada vantagem ou utilidade pelo fornecimento de um certo bem/serviço ou uma remoção de um certo limite jurídico à sua actividade. Logo, ao contrário dos impostos, as taxas implicam uma contrapartida efectiva para quem as paga.
III) As contribuições especiais: pagamentos exigidos pelo Estado a quem usufrua de uma dada vantagem indirecta reflexamente auferida.
Ora, o facto de se pagar portagem, reflecte o pagamento da contraprestação de um serviço: poder circular numa via rodoviária com as condições físicas e os requisitos de segurança necessários a uma velocidade máxima de 120 Km/hora, com estações de serviço e de reabastecimento bem como de áreas de descanso. Ou seja, a taxa é, ou deveria ser, fixada pelo bem/serviço fornecido e na sua proporção.
Todavia, o que acontece não é isso. Independentemente de haver ou não a contraprestação do serviço, a taxa é sempre cobrada sem qualquer correcção: não importa se existem obras que obriguem a circular a baixa velocidade ou estar mesmo parado em plena auto-estrada, ou se a deficiente drenagem obriga a que em tempos de chuva se seja obrigado a circular sobre os chamados lençóis de água.
Temos, assim, que apesar de muitas vezes o utilizador não usufruir do serviço/bem a que tem direito é forçado apagar, ou seja como se de um imposto, e não de uma taxa, se tratasse.
Pela mesma lógica alguém poderia entrar num hospital, não ser atendido porque os médicos estão de greve ou por qualquer outra razão e, mesmo assim, ter de pagar a taxa moderadora, independentemente de qualquer contrapartida.
Terá este governo a preocupação de, uma vez por todas, acabar com estas, e outras, imposições ilegais que vão grassando neste país, uma vez que está tão preocupado em levar por diante a sua batalha reformista em nome da justiça social, da transparência e da verdade?

j.marioteixeira@sapo.pt