segunda-feira, 8 de novembro de 2004

Clonagem: a ilegítima opção portuguesa

A 18 de Outubro, escrevi aqui a propósito desta notícia, chamando à atenção para o facto de se aproximar uma importante e crucial discussão acerca da clonagem.
Num país com um governo civilizado, a questão da clonagem deveria ser abordada pelo poder político quer junto da comunidade científica que junto da sociedade em geral.
A questão base está na diferenciação entre a clonagem para efeitos reprodutivos e a clonagem em células estaminais para efeito de investigação no combate a doenças fatídicas como o cancro.
Quem já teve de acompanhar pessoas que ama num processo de penosa e decadente morte, acompanhando a quimioterapia ou radioterapia, conhece bem o quanto é profundamente humano o anseio pela descoberta de soluções médicas. E quem não teve esse tipo de experiência pessoal, algum dia ficou chocado com a morte de alguém por cancro ou qualquer outra doença sem cura. É humano.
O que não é natural e não é humano é que o governo de Santana Lopes tenha assinado, em nome de Portugal, a "Declaração da Costa Rica" contra qualquer tipo de clonagem, colocando Portugal ao lado daquele país cuja Declaração foi apresentada a mando dos EUA [que também subscreve a dita Declaração], voltando de novo as costas à Europa e ao esforço desta em fazer valer uma causa que não é só política mas de cada um.
Portugal, uma vez mais, alheia-se da discussão pública das causas, dos compromissos, age de modo irresponsável e autista. Portugal, não: o governo português.
Ninguém da comunidade científica foi ouvido, nenhum debate nacional se fez em volta desta matéria. Talvez porque andava tudo muito “pré-ocupado” com o “Caso Marcelo”, ou com o "Referendo do Tratado Constitucional Europeu” para que se achasse necessário estar a incomodar o povo com estas coisas.
Serve isto, também de alerta à blogoesfera: haja cuidado para que não se transforme a blogoesfera em caixa de ressonância da atmosfera, transformando-a em mera linha de produção de reacções ao que se torna mais mediático “lá fora”.

j.marioteixeira@sapo.pt