quinta-feira, 30 de dezembro de 2004

Os dogmas da militância

“[…] Recusando-se a mudar a liderança e enterrar este episódio infeliz, o partido pode ter comprometido o seu futuro. Aliás, esta situação é pouco sadia, até porque muita gente no PSD sabe que este comportamento é suicidário e há alguma má-fé na esperança que sejam as urnas a afastarem Santana Lopes da direcção do PSD. Mesmo sabendo que isso pode significar um longo período de governação socialista”.

[in Público]

Hoje, Pacheco Pereira escreve acerca dos cenários das próximas eleições, recuperando as suas críticas a Santana Lopes e Paulo Portas, sem resistir a uma referência saudosista a Cavaco Silva.
Lendo aquele artigo, do modo como analisa a actual situação do PSD e do perigo que este corre em ser afastado do poder por um largo período, percebe-se porque é que ao fim e ao cabo irá, como o próprio já o disse, votar PSD: o perigo da governação socialista.
Não importa que Santana Lopes seja o “caos” ou o “populismo”. O que importa, isso sim, é que não se permita que o PSD seja arredado do poder, ou sendo-o, que o seja por pouco tempo. Por causa da governação socialista, claro.
A lógica dominante é, claramente, a da militância. Onde a ideia “Primeiro o país, depois a Democracia e por fim o Partido” só vale para a contestação de uma liderança ou como exercício de uma qualquer Sebastianismo. Mesmo aqui, a lógica militante sempre dirá que o melhor para o país, é o Partido, e como tal vota-se no “caos”, no “populismo” ou na “incompetência” porque é o menos mau do mau. E o pior do mau, são os outros. Não importa quem.
Existe ainda uma outra vertente: ao denunciar a actual situação do Partido, ao mesmo tempo que classifica de má-fé aqueles que aguardam que sejam as urnas a afastar Santana Lopes da liderança, acaba por se manter como voz incómoda mas fiel. É este exercício desgastante que é forçado a fazer quem quer conciliar a independência de pensamento com a lógica da militância partidária.
Nos períodos pré-eleitorais é normal assistir-se aos actos de nobre militância, aos quais se sucedem, em caso de derrota, os ajustes de contas na contabilidade de deve e haver dos aparelhos partidários.
Este artigo de Pacheco Pereira, mais do que uma repetição de críticas a Santana Lopes ou Paulo Portas, mais do que uma denúncia das novas gerações de políticos profissionais, é um subtil “Presente!” à chamada do Partido.