quinta-feira, 16 de dezembro de 2004

A Turquia às portas da Europa

Custa-me um pouco assimilar a abertura de negociações para a entrada da Turquia na união Europeia. Trata-se de um perigo real em matéria não só de segurança como também de conivência com as promiscuidades da esfera religiosa na esfera política e demais atropelos à lógica de um Estado de Direito Democrático. Isto é real, sem embargo de avanços em sede de direitos humanos na Turquia. Mas parece-me sinceramente que é pouco, mesmo até a avaliar pelas reacções das autoridades políticas turcas quanto a abordar esta matéria: mantém-se a mesma arrogância natural das mentes fundamentalistas. É um claro sinal, e não parece que seja bom.
A propósito, recordo o que Vasco Graça Moura escreveu no DN em 20.10.2004 [link não disponível], a propósito da entrada da Turquia, e realço o seguinte:

A nova grande polémica europeia já começou a propósito da candidatura da Turquia à entrada na União. A análise do cumprimento dos critérios de Copenhaga, nomeadamente o da consagração do Estado de direito (com todas as suas implicações, da separação entre a esfera civil e a esfera religiosa ao respeito dos direitos humanos e das minorias), e o da existência e funcionamento de uma economia de mercado viável, dificilmente vai iludir uma outra questão mais profunda: a da compatibilidade civilizacional e cultural.
A recomendação que a Comissão Europeia acaba de apresentar ao Conselho e ao Parlamento sobre a acessão da Turquia à União examina todos os aspectos que se queira imaginar menos este.
Sobre isso a Comissão é notoriamente vaga: limita-se a dizer que é preciso reforçar o diálogo entre a União Europeia e a Turquia e propõe a realização de uns fora em que participe a sociedade civil
”.
[…]
É certo que as negociações de acessão só podem ter lugar no quadro da Conferência Intergovernamental e com aplicação da regra da unanimidade, mas, se ela se der, a Europa passa inevitavelmente a ser uma realidade diferente, já sem coincidência com o seu perímetro geográfico, com uma alteração significativa das suas características civilizacionais e culturais, e apresentando novidades geostratégicas suplementares, desde um novo fôlego para a sua já antiga participação na NATO até à luta contra o terrorismo”.

Depois de um alargamento para 25, em pleno debate acerca do Tratado Constitucional Europeu nos diversos Estados-membros, e ainda com uma patente ausência de um sistema eficaz de controlo e combate integral ao terrorismo, será a União Europeia capaz de garantir a lucidez e a ponderação necessárias a uma integração harmoniosa da Turquia?

Vasco da Graça Moura terminava aquele seu artigo da seguinte forma:

O caminho oficial traçado por Bruxelas parece decididamente a favor, embora ressalve o resultado das negociações finais. Se se concretizar, só o tempo dirá se não foi uma imprudência muito cara”.

Para mim, as imprudências presumem-se sempre caras e, dada a matéria em causa, só poderão ser muito.

j.marioteixeira@sapo.pt