terça-feira, 8 de novembro de 2005

O rastilho

O aproveitamento político-partidário sem pudor das crises sociais é um fenómeno global: na França há já quem compare a onda caótica de banditismo ao Maio de 68. Está é mais abjecta comparação que se poderá fazer, mas espelha uma clara tentativa em transformar a vaga de destruição com perigosos perfis de guerrilha urbana, numa manifestação social de marginalizados do mundo industrial.
Comece-se por se recordar qual foi o rastilho: dois assaltantes de um banco que se refugiaram da perseguição policial numa cabine eléctrica, morreram electrocutados. As vítimas não foram pela queda de um prédio num qualquer bairro social nem não foram vítimas de violência policial. Eram delinquentes, criminosos que fugiam à polícia e que foram infelizes na escolha do esconderijo.
Fosse tudo isto promovido por apoiantes de Jean-Marie Le Pen, mobilizando “jovens desempregados e marginalizados” de ideologia fascista ou nazi, cabeças rapadas e companhia, e sempre seria interessante ver se haveria tanto apelo à tolerância.
Não significa isto que não haja problemas sociais e de integração social para resolver. Mas é preciso lembrar que se há país onde o Estado tem em prática políticas sociais de integração, ao contrário, por exemplo da Inglaterra que privilegia os guetos, é a França que possui um modelo social - aliás um modelo social bem oneroso sustentado com impostos de muitos que agora têm os seus bens destruídos pelo fogo.
É de uma total irresponsabilidade quem por cá anda a dizer que também temos problemas sociais, iguais aos que estarão na base da actual barbárie que assola França. Uma irresponsabilidade que só se pode justificar pelo facto da instabilidade social ser o capital de maior importância na luta política, não importa a que preço.

j.marioteixeira@sapo.pt