terça-feira, 27 de dezembro de 2005

Coisas assim

Se o Natal é uma daquelas “desculpas” institucionalizadas para reunir a família, já a passagem de ano é uma espécie de “diversão obrigatória”.
No primeiro caso há sempre a utilidade de expurgar a consciência da alma por aquelas horas que não investimos em estar com este ou aquele familiar. Porque a vida de hoje [tal como era aquela “de hoje” há 30 anos atrás] é muito rápida, frenética, desgastante. Corre-se muito e quando se corre todo o tempo conta. Conta para correr, claro. Adiamos o telefonema que estamos para fazer há algum tempo, não nos desviamos dos caminhos rotineiros para fazer aquela visita. Com as prendas salvamos as culpas dos momentos importantes a que faltamos na vida dos filhos. E por aí adiante. Porque no Natal podemos redimirmo-nos dessas nossas faltas, fazemos “reseat” ao contador das nossas faltas, tudo volta a zeros e assim sentimo-nos melhor com o nosso próprio peso.
Mas na Passagem de Ano a coisa é um pouco diferente: há a institucionalização de nos divertirmos. Não tem qualquer lógica chegar àquele ponto do calendário e deixarmos passar a perene efeméride. É imperioso que se festeje a entrada do ano novo, que haja diversão, alegria. Porque assim é, porque assim sempre foi. E não tem lógica que assim não o seja. Quem não festeja terá de estar doente, triste ou deprimido.
Se o Natal é a nossa última instância de redenção, a Passagem de Ano é o derradeiro exercício de formatação social.

j.marioteixeira@sapo.pt