quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Sistematicamente

É voz corrente que tudo o que de mal vai neste país é, invariavelmente, culpa do sistema.
Ora, por sistema entende-se um conjunto de partes coordenadas de modo a formar um todo científico ou um corpo de doutrina, ou então uma reunião ou combinação de partes para concorrerem para certo resultado ou de modo a formarem um conjunto.
Assim, somos o único país do mundo que vê que o seu problema, o seu basilar problema, definido cientificamente. Mais nenhuma nação em todo o mundo se pode gabar disso. Só nós!
E é fácil de ver: se o ensino não funciona é do modo como está estabelecido o sistema de ensino; se os órgãos políticos não dão resposta aos nossos problemas é porque o sistema político não funciona; e o mesmo se diga do sistema de saúde; o futebol não é sério, por culpa do sistema; os bancos não operam quando ficam sem sistema; a informação é manipulada pelo sistema; se o sistema informático do Fisco diz que somos devedores lá temos de nós de reclamar e provar por escrito o contrário, para que se possa “actualizar” o sistema; todos se queixam do sistema judiciário, etc.
Aliás, se um sistema informático não permite algo, não importa se temos razão ou direito. O sistema não permite, e o sistema é que manda!
Somos governados, dirigidos e orientados por um mecanismo (para não estar sempre a dizer “sistema”...) que nos dita regras, condutas, limites e posturas. Como se tudo fosse dirigido por uma entidade abstracta que sistematicamente sistematiza o sistema em que vivemos.
Uma espécie de nova divindade: acredita-se que existe, é omnipresente e omnipotente, mas vê-la à luz do dia é missão impossível.
E assim vão as nossas vidas, ditadas por uma entidade, de contornos obscuros e ocultos, manobrada não se sabe bem por quem, mas que sistematicamente lá vai moldando o nosso sistema de vida.
(In "Opinião Pública", edição de 06.01.2010)

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