terça-feira, 16 de novembro de 2004

Fundamentalismo Europeu ou uma escolha difícil [II]

A minha dúvida acerca do rótulo a adoptar, de entre os propostos por alguns “democratas” partidários do “sim” ao Tratado Constitucional Europeu, avoluma-se quanto mais penso acerca do assunto.
Olho em redor e vejo um país com mais de oitocentos anos de história a caminho da cisma: aceitar ou não uma Constituição Europeia a que se irá subordinar a nossa própria Constituição?
Desde logo a ideia de aceitar uma Constituição acima da nossa, arrepia-me. Por algumas razões muito simples:
1 - A nossa Constituição resultou de muita luta política, partidária, e, atente-se, popular, de uma vontade enorme em transformar;
2 – A nossa Constituição ainda está por cumprir em muitos aspectos fundamentais, com maior incidência nas suas previsões sociais;
3 – A Europa é um conjunto de países e não um país, um conjunto de Estados ainda soberanos, pelo que não se vislumbra qualquer necessidade ou proveito para Portugal [peço desculpa por dar relevo ao que interessa ao meu país] na aprovação de um Tratado Constitucional;
4 – A aprovação do Tratado Constitucional Europeu, uma vez que a Europa ainda é um conjunto de Estados soberanos, é sem qualquer margem de dúvida um importante avanço do Projecto Europeu no sentido do reforço da linha Federalista, a mesma que não revela qualquer vantagem [antes pelo contrário] para um país como Portugal [reforço o meu pedido de desculpas anterior];
5 – A redacção do Tratado Constitucional Europeu não foi levada a cabo por uma Assembleia Constituinte formada por eleitos dos povos europeus, por uma razão muito simples: tratou-se de um processo político de base institucional, longe de qualquer olhar dos povos europeus e muito pouco democrático.
Não é por mero exercício de uma qualquer demagogia, mas antes por um direito que me é próprio e legítimo, por muito que custe a alguns “democratas” do “sim”: orgulho-me da Constituição Portuguesa e exijo, antes de mais, o seu cumprimento!
Muito gostaria de ver muita da nossa classe política preocupada em fazer cumprir a nossa Constituição ao invés de estar preocupada em querer vender um novo produto. Gostaria de a ver preocupada com a construção de uma sociedade mais justa, ao invés de se preocupar com Cartas de Direitos Sociais quando os mesmos estão por demais consagrados no direito nacional e são constantemente atropelados. Gostaria de ver alguma da nossa classe política preocupada em fazer Portugal criar riqueza que sustente os custos das consagrações sociais da nossa Constituição.
Não é por mero acto “soberanista” ou “nacionalista”, mas apenas porque não existe qualquer base de vontade ou de legitimidade popular na génese do Tratado Constitucional Europeu. A verdade é que este Tratado Constitucional Europeu nem filho bastardo é, pois não tem pai nem mãe, resultando apenas de produção laboratorial. E, agora, o laboratório quer que sejamos nós a adoptá-lo como parte integrante da nossa família e da nossa vida quando não fomos antes chamados para a sua concepção ou educação.

j.marioteixeira@sapo.pt