quinta-feira, 30 de dezembro de 2004

Sistema eleitoral: os deputados e a [falta de] territorialidade [II]

Continuando o que escrevi aqui:
O facto do nosso sistema eleitoral não vincular o deputado ao círculo eleitoral pelo qual é eleito, permite distorções de representatividade. Permite, também, os “candidatos pára-quedistas”, sem qualquer ligação à terra pela qual são eleitos. Permite os discursos demagógicos repletos de lugares comuns e de saberes artificiais. Promove os discursos transformados em música para os ouvidos de quem se tenta cativar o voto. Permite, por exemplo, que um autarca se candidate pelas listas de um certo círculo, para depois de eleito dar a sua vez a quem se segue na lista. Neste momento fala-se do caso Menezes, mas isto é prática reiterada há muito.
Acresce que esta situação acarreta ainda uma outra consequência: as dos monopólios eleitorais. A mesma "figura" bate-se nas eleições legislativas e autárquicas, é a mesma personagem que monopoliza discursos e “tempos de antena”. Fazendo com que os actos eleitorais acabem por se perpetuarem à volta dos mesmos nomes, sem novidade ou surpresa. É tudo visto e repetido. Cansa. Enjoa.
Temos, assim, criadas as condições para que alguns indivíduos se prestem a candidatos profissionais e que façam da campanha eleitoral aquilo que o actual sistema a transformou: caça ao voto. Um pouco à luz do que se passa em outras coisas da vida, cria-se uma "liga de mercenários" dispostos para aquilo que chamam de "combate político", quase sempre em sinal de sacrifício militante. Mais tarde, inter pares, esse actos serão devidamente "lembrados".
As candidaturas eleitorais sem qualquer vinculação territorial, excepto num conceito abstracto de interesse nacional, permitem uma imunidade real e confortável quando certas promessas ficam por cumprir. Porque permitem que alguém, hoje candidato pelo Porto, amanhã o seja por Coimbra ou Faro, tanto prometendo apoio ao vinho, à ciência ou ao turismo. Porque em Roma, sê romano.

j.marioteixeira@sapo.pt